Este poemário mereceu o Prémio de Poesia Fiz Vergara Vilariño 2015. Foi publicado por Espiral Maior e está traduzido ao basco por Txerra Rodriguez, em edição digital de Bookteg
Sem título
Queria escrever um poema bonito e doloroso como uma vénus abortando
Queria que pensaras na serenidade de Mandela quando digo prisão
que brilharam como esmeraldas a bijuteria das reclusas ou das carcereiras
e ao final de cada verso sorriras com iodo
Que isto passe se entendemos a vida assim
como algo tão lindo como a morte ou mais.
Este trânsito no que as comparações são espadas finíssimas e a justiça é cousa do além.
E se crês em deus, desfrutarias de ver que amor tão puro nasce das putas e as freiras em prisão aí não há competitividade nem juízo só duas mulheres a amarem-se como guerreiras
Mas voltemos ao poema
pensa nas árvores autóctones no coral
nas ondas do mar dos desenhos orientais no cheiro
delicado da flor da laranjeira com isso também sonham os presos
com beijos com pão de broa com carícias com vises
que não chegam com citalopram e meta com chutas definitivas
de heroína sem adulterar.
Alguns -os mais vivos- também sonham com vingança
mas não me vou estender com isso quero voltar ao amor.
Que não digam que este texto saiu do comité central da COPEL.
ANEDOTA Nº10
Atirou-se às vias. A eletrocussão é imediata. O corpo explodiu como eu imagino que explotará o sol dentro de duzias de miles de anos. Salpicou à gente. A mim, para além de sangue deu-me uma astilha minúscula dum osso na cara. Justo debaixo do olho por sorte. Abriu-me uma ferida. De esse dia é a cicatriz da façula e a hepatite. Foi em Hounslow West (zone 5), mas poderia ter sido em Cesures.